No dia 28 de abril de 2025, vivi um episódio que nunca pensei viver. O país mergulhou num apagão que para uns durou cerca de 10 horas e para outros um dia inteiro. Eu estava no supermercado quando, de repente, as luzes se apagaram. Foi curioso - e até um pouco irónico - perceber como o medo se espalhou rapidamente. Num instante, o espaço que estava cheio ficou quase vazio, com pessoas a saírem apressadamente, como se a falta de luz fosse um prenúncio de algo pior.
Horas depois, fui ao carro ouvir a rádio para saber como estava o país e ouvi que os supermercados se encheram, mas desta vez com uma ansiedade diferente, quase desesperada. As pessoas regressaram para comprar tudo o que conseguiam, numa tentativa de se protegerem da escassez que o apagão anunciava. Este comportamento coletivo, tão humano, mostra como a incerteza pode alterar radicalmente a nossa relação com o quotidiano e o consumo.
Mas o apagão não foi só a ausência de luz. A falha atingiu também as comunicações móveis e a internet. Mesmo com o telemóvel carregado, não consegui contactar ninguém. Num mundo em que a nossa vida social e profissional depende da conectividade, ficar sem acesso à internet é, acima de tudo, sentir-se isolado do mundo.
Em casa, a rotina simples que tínhamos tornou-se um desafio. A impossibilidade de usar o computador, a televisão ou até a máquina de café fez-me perceber o quão dependentes somos da eletricidade para o nosso conforto e produtividade. A ausência da internet impediu-me de trabalhar e de me comunicar com quem estava longe, aumentando a sensação de impotência.
No início, confesso que fiquei bastante irritada com a situação. Mas, passado o choque inicial, consegui encontrar um lado positivo. Aproveitei para ler - algo que não fazia há mais de quatro meses - e fui ao parque, um tempo para mim que, nos últimos dois meses, simplesmente não tinha conseguido arranjar. Foi um pequeno respiro num momento inesperado, que me fez perceber como, na ausência do habitual ruído tecnológico, redescobrimos o valor do tempo para nós próprios.
Apesar do caos visível nas ruas - semáforos desligados, transportes públicos parados, pessoas a percorrer longas distâncias a pé - havia também uma outra realidade a se desenrolar. Os parques, as praias e as ruas enchiam-se de gente. Crianças, habituadas à era digital, brincavam à bola, enquanto os pais se juntavam a elas, partilhando momentos simples e genuínos. Adultos que, habitualmente, saíam do trabalho para se refugiar no conforto do lar, encontravam-se agora nas ruas, a redescobrir o prazer do convívio e da diversão ao ar livre. Eu vi um retrato inesperado de uma sociedade que, por momentos, voltou a respirar e a viver de forma mais humana.
Embora a origem exata ainda não esteja totalmente esclarecida, este episódio expôs, sobretudo, a fragilidade das infraestruturas portuguesas, que ficaram à mercê de falhas técnicas e da dependência de sistemas obsoletos. Este apagão foi também um lembrete da importância da preparação individual para emergências - ter lanternas, carregadores portáteis, dinheiro físico - tudo aquilo que eu não tinha em casa. Faz toda a diferença ter um plano quando o inesperado acontece.
No fundo, este episódio revelou-nos algo muito mais profundo do que a simples falta de eletricidade ou internet. Foi um convite a refletir sobre a fragilidade da nossa dependência tecnológica, mas também sobre a força da nossa capacidade de adaptação e solidariedade. A eletricidade e a conectividade são, sem dúvida, pilares essenciais da vida moderna e da nossa liberdade individual. Porém, é na forma como nos unimos, como cuidamos uns dos outros e como nos preparamos para o inesperado que reside a verdadeira esperança.
Fotografia: Feliperpv, CC0, via Wikimedia Commons